domingo, 15 de março de 2015

TRAVESSA EM FAIANÇA, MOTIVO “CASARIO”, DE COIMBRA (?)

Interessante travessa de cantos arredondados, monocromática, em tons de castanho, partida, gateada há muito, estimada e conservada – Faiança de Coimbra? – Cremos que sim!


No covo possui a decoração designada por “Paisagem” ou, mais propriamente por “Casario”, composta por edificações (igreja ou “challets”), com bandeirolas; ladeadas por exuberante arborização e adequada base de enquadramento, esponjada.


No horizonte, aves sobrevoando as edificações, entre a arborização e algumas nuvens, lá longe.


Esta decoração leva-nos aos “brasileiros” “torna-viagens” que no seu regresso, edificações semelhantes, ditas “challets”, edificaram pelo centro e norte do país.




Na aba, junto à bordadura um largo filete castanho-claro e uma trabalhada decoração de cornucópias ou grinaldas, repetidas, encadeadas, que por vezes ligeiramente sobrepostas; estampadas - aplicadas a “chapa recortada”, o vulgo “stencil”; numa tonalidade castanho-escuro, que sobressai da tonalidade geral da travessa, em castanho-claro.


Cremos tratar-se, de forma inequívoca, de uma faiança de fabrico de Coimbra, pelo tipo de decoração, em especial a vegetação (arvoredo), pelo esponjado do embasamento da decoração, bem assim como pelo filete da bordadura da aba e pela decoração da aba aplicada a chapa recortada; para lá do esmalte amarelado da peça.

Se a monocromia fosse em tons de verde, logo haveria, provavelmente pessoas a sugerir ser de Caminha, ou mais especificamente de Vilar de Mouros.


Mas mesmo que fosse nesses tons de verde e pelas características da decoração, mantínhamos a nossa opinião de ser fabrico de Coimbra.

Como é óbvio trata-se de peça não marcada e por conseguinte de difícil atribuição de fabrico e catalogação, mas pensamos que se poderá atribuir o seu fabrico a Coimbra.


Arriscamos-nos a sugerir que se trata de um fabrico de um período que medeia entre meados e final do século XIX. Será?

Comentário (2015-04-06):

No seguimento de um oportuno e esclarecido comentário de Luís Montalvão, http://velhariasdoluis.blogspot.pt/; há a referir que a decoração da travessa que apresentamos se inspira no motivo inglês, padrão "Roselle", "que é composto por um romântico chalet e uma árvore, que ladeiam um lago, onde se avista ao longe um castelo. Roselle é o nome de uma localidade italiana no Sul de Florença, que era um ponto de escala do chamado Grand Tour", tal como refere o Luís Montalvão.

(Caneca inglesa com padrão "Roselle", fabrico da John Meir & Son, apresentada na fonte 4)
Igualmente na mesma fonte (4), é afirmado que: "Em Portugal, segundo aprendi com o mercador veneziano, O Roselle foi copiado pela Fábrica de Massarelos. Foi também adaptado de forma popular por um fabricante que algumas leiloeiras identificam como Vilar de Mouros e outras por loiça de Coimbra.", o que em certa medida vem confirmar o padrão da nossa travessa.

(Travessa em faiança nacional com motivo inspirado no padrão inglês "Roselle", exibida na fonte 4)

Aqui fica pois o comentário que se justifica e a inspiração do motivo da travessa, no padrão inglês "Roselle".


Fontes:

1) – “Faiança Portuguesa Séculos XVIII-XIX”, Colecção Pereira de Sampaio, Editores ACD, 2008.

2) – “Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, Organização, Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da Rocha Pinto, Editorial Presença, 3ª Edição, Lisboa, 1987.

3) – “Faiança Portuguesa – Seculos XVIII-XIX”, de Arthur de Sandão, Livraria Civilização, 2º Volume, Barcelos, 1985.

4) - http://velhariasdoluis.blogspot.pt/2011/02/o-grand-tour-ou-caneca-inglesa-da-john.html;



PRATO COMEMORATIVO DO 4º CENTENARIO DA CHEGADA À INDIA DA FABRICA DE LOUÇA DE SACAVÉM

A Fábrica de Louça de Sacavém presenteou-nos ao longo dos seus muitos anos de fabrico com pratos decorativos, policromáticos, de rara beleza, muitos dos quais ainda, felizmente, existem.


Reportamos-nos hoje a um belo exemplar, policromático, decorado a tons de verde, azul, castanho e vermelho, tendo como motivo a comemoração do 4.º Centenário da chegada de Vasco da Gama à Índia, em 1498, logo um exemplar, provavelmente, de 1898.

Como não podia deixar de ser a decoração apresenta os motivos alusivos a tal comemoração:


- a figura principal, no covo do prato, lateralmente: D. Vasco da Gama, na cor azul, com um colar, ao peito, com a Cruz de Cristo, a vermelho;


- em local oposto do covo e estendendo-se até à aba, na cor castanho, a Torre de Belém, engalanada com uma bandeira à época do descobrimento;

- na aba uma cercadura interrompida, em cordame com nós, na cor verde, atravessando três bois, na cor vermelha, com um debrum, onde é exibida uma outra Cruz de Cristo, a verde com o interior a vermelho e sob a mesma a data 1497 – 1898.


- o remate da corda com o Escudo de Portugal, sobre uma âncora, na cor verde; Escudo esse com os castelos na cor amarela e as quinas na cor azul.


Em suma, um conjunto de símbolos manuelinos que se reportam a essa Epopeia dos Descobrimentos Portugueses.

Exemplar semelhante, mas só a duas cores já foi exibido no blogue citado em (2), cujas imagens reproduzimos aqui com autorização do seu autor.





Um prato semelhante a este já foi apresentado no livro referido na fonte (6) a páginas 368.

Por outro lado no blogue citado na fonte (3) também já foi exibido um prato policromado, igualmente a três cores, mas diferentes das do que apresentamos.



Para identificação do mesmo apresentamos foto do prato, com a devida autorização do seu autor deste excepcional e deslumbrante blogue: http://memoriadosdescobrimentosnaceramica.blogspot.pt;

O prato encontra-se com marca inserida na pasta – a coroa real e sob a mesma “SACAVEM”, pelo que corresponde a um fabrico da época iniciada em 1885-1886 e que se prolongou, provavelmente até 1905, convivendo com outros carimbos aplicados à época e que neste caso confirma-se pela data comemorativa do prato. Eis pois um parto do final do século XIX.


Neste fabrico de pratos foi utilizada um tipo de pasta cerâmica com a aplicação de granito e que veio a receber o nome de “pó de pedra”.

Fontes:   




4) – “Fábrica de Louça de Sacavém – Contribuição para o estudo da indústria cerâmica em Portugal 1856-1974” de Ana Paula Assunção, Coleção História da Arte – Edições INAPA – 1997;

5) – “150 Anos – 150 Peças – Fábrica de Loiça de Sacavém” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Março de 2006;

6) - “Porta aberta às memórias” – 2ª edição, Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2009;

7) – “Porta aberta às memórias” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2008;

6) – “Dicionário de marcas de Faiança” de Filomena Simas e Sónia Isidro – Edição Estar Editora - Lisboa – 1996;



sábado, 14 de março de 2015

PRATO DE SUSPENSAO, PUBLICITARIO, DA FÁBRICA DE ALCANTARA

Pensamos que a lógica de um coleccionador é não ter lógica!

Em especial quando se trata de coleccionar cerâmicas; quer faianças, quer porcelanas, quer azulejos ou mesmo terracotas.

Para além das categorias formais, das escolas, das épocas, das tipologias, das peças, do seu valor intrínseco ou comercial, pensamos que está acima de tudo o gosto pessoal, a empatia que as peças nos criam e que nos leva a coleccioná-las de modo caprichoso e despretensioso.

Mas, como é óbvio, sem deixar de considerar o seu valor estético, histórico e quiçá comercial.


Tudo isto a propósito de um Prato de Suspensão, Publicitário, da Fábrica de Louça de Alcântara.

Temos, desde há muito, empatia pela faiança de Alcântara, a qual ainda aumentou a partir da palestra de Jaime Regalado, dada a 23 de Janeiro passado no Museu da Fábrica de Louça de Sacavém, pela eloquência da mesma e pela apresentação e descrição efectuadas, com o desvendar de muitas interrogações. (Para quando a publicação do respectivo livro?)

Trata-se de um prato liso, sem covo e aba, de suspensão, com os respectivos orifícios de pendurar efectuados no único frete do tardoz do prato.



É um tipo de prato recorrente, publicitário, do Comerciante Albino J. Baptista, com sede na Rua Nova do Almada, n. 92, em Lisboa, (ao Chiado), que se dedicava à comercialização de “Guardas Chuvas muito bons e baratos” e a “Leques e Sombrinhas de Phantasia”.

Este prato calendário, do ano de 1889 e por conseguinte efectuado, provavelmente no final do ano de 1888, apresenta-se na cor monocromática castanha.


Para além do calendário em si, exibe três guardas chuva, de dimensões diferentes, dois leques e sete bengalas de diversos formatos de punho e uma jovem senhora, elegantemente vestida à época, com um guarda-chuva, voltado do avesso, sob copiosa chuva.


No limite da bordadura a identificação “LOPES & CA – ALCANTARA”.


No tardoz do prato, a marca é inequívoca e expressa de forma incisiva:

 “L. & C.”, “LOUÇA À INGLESA”, “FÁBRICA D’ ALCANTARA”, “LISBOA” e “TRAVESSA D’ ASSUMPÇÃO 37 E 39”.


Corresponde a uma das marcas usadas no período temporal de 1886 a 1900, o que se confirma pela data do próprio calendário do prato.


O blogue (3) já apresentou um prato igual, mas monocromático verde, cujas imagens apresentamos com a devida autorização do seu autor, enquanto o que exibimos é monocromático castanho.


Aqui fica o registo do prato.



Fontes:

1) –

2) - “Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, com Organização, Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da Rocha Pinto, Editorial Presença – 3ª Edição – 1987;



sexta-feira, 13 de março de 2015

PRATO EM CANTÃO POPULAR, DE SÃO ROQUE – AVEIRO – COM MARCA

Apresentamos hoje um prato raso moldado, de formato circular, de aba pouco elevada, com decoração monocromática azul, motivo “Cantão Popular”, com marca de fabrico – São Roque – Aveiro.


Possui carimbo monocromático castanho de formado e configuração não habitual, para identificar a fábrica em causa.


A maioria das peças estão marcadas com carimbo circular, dentro dele algo que se assemelha a um “8”, como alguns dizem, mas mais não é de que a cabaça alusiva a São Roque. Razão pela qual também existem alguns carimbos também com um bastão.


Existem peças semelhantes da mesma fábrica, com decoração idêntica, mas com o carimbo habitual desta fábrica.


Trata-se, por tal motivo uma peça interessante, por ser pouco vulgar a aposição deste carimbo.


Como sabemos a Fábrica de Faianças S. Roque, em Aveiro, que foi criada em 1955 pelo ceramista João “Lavado” (João Marques de Oliveira) (1905-?), então sócio da Fábrica de Louças e Azulejos de S. Roque, vulgarmente conhecida por Fábrica de S. Roque, esta fundada nos finais da década dos 20, por Manuel da Silva e Justino Pereira Campos, localizada no canal de São Roque.

A fábrica, Faianças S. Roque, apresentou as suas últimas contas a 27 de Dezembro de 2001, tendo o seu encerramento e dissolução sido registado em Outubro de 2002 e publicado em Diário da República, no mês de Dezembro do mesmo ano.

Esta fábrica, Faianças S. Roque, dedicou-se exclusivamente à produção de louças decorativas e utilitárias, tendo produzido bastante louça decorada com escorridos. Existem várias peças marcadas que exibem combinações de cores: castanho, amarelo, verde e preto nesses escorridos.


Como não podia deixar de ser, e a exemplo de outras fábricas de Aveiro, também produziu peças com decoração do motivo “Cantão Popular”, com um conjunto de imagens, símbolos e arranjos ao gosto do artista, marcando a diferença para as demais e criando um estilo próprio, não faltando o habitual ondulado na parte interior da aba, a canelura, antes da faixa ou largo filete que delimita o covo da aba.


Por outro lado o habitual largo filete no limite da aba foi substituído por dois filetes, relativamente espaçados, com uma interessante decoração arrendada entre eles, com reservas decoradas com dois elementos, um dos quais parece ser uma viola e o outro um barril deitado (?).


No covo, o motivo da decoração, pese embora com os habituais elementos simbólicos, os mesmos são bastante diferentes dos correntemente utilizados à época ou em épocas anteriores, encontrando-se muito ocidentalizados e com a representação das nuvens, do horizonte e da água de modo, mais simples e estilizada.

As edificações representadas também possuem uma imagem mais ocidentalizada do que as que habitualmente decoram este motivo.


Em suma mais uma versão de “Cantão Popular”, esta das Faianças de São Roque.

Crê-se que se trata de um fabrico por volta da década de 50 do século passado - mas sem certezas.

FONTES:


quinta-feira, 5 de março de 2015

A Faiança Portuguesa – Conservação, Estudo e Divulgação.


Há algum tempo atrás numa das feiras de velharias realizadas na Marginal, entre Lisboa e Cascais, passava algum tempo conversando com pessoa amiga e conhecedor destas “andanças” das faianças, trocando opiniões quanto à sua conservação, estudo e divulgação.

Esse meu amigo, dizia que “não valia a pena perder tempo” com faianças de menor importância, de fabricação reduzida ou mesmo de “imitação”; estamos a falar de reproduções livres em faianças decorativas baseadas em peças de reconhecido valor de séculos anteriores.

Reforçava que fabricos reduzidos, com simples implantação a nível regional, não tinham interesse, e que em contrapartida nós, os apreciadores e coleccionadores, nos deveríamos debruçar e despender o nosso tempo, conhecimento e dedicação às faianças mais importantes e aos fabricos nacionais mais reconhecidos.

A minha visão é diferente, mais ampla e abrangente, pois para se ter uma visão adequada do património das artes decorativas, e especificamente, das faianças, há que conhecer, dentro do possível, os fabricos e produções havidas em Portugal, não descorando os do século XIX e XX, inventaria-los e divulga-los, de modo a não ser perderem, irremediavelmente.

Considero que um coleccionador pode obviamente optar por uma fábrica, um fabrico, um motivo, um tema, etc. e não terá que ser abrangente, mas se possível for, o contribuir para a divulgação do património produzido a nível de faianças, especialmente no século passado é “um dever”.

Só o registo e divulgação poderão manter vivo alguns fabricos, pois caso contrário, de forma efémera, as frágeis peças produzidas serão consumidas pelo uso, pelo tempo, em suma, pela evolução da sociedade.

Considero que uma atitude abrangente, para além de se possuir e divulgar peças de referencia de fabricos de qualidade e de valor indiscutíveis, que qualquer coleccionador gostaria de ter; também as peças modestas, de menor valor ou importância, sem qualquer estatuto ou consagradas deverão ser conservadas, coleccionadas, conhecidas, inventarias e divulgadas, de modo que a sua produção e existência fiquem registadas para a posteridade.

É imprescindível, com a devida atenção e sem pretensiosismos dar valor às faianças não consagradas, de menor valor ou divulgação; dar a conhecer as mesmas a todos, pois são, sempre, peças com valor, produzidas com afecto, em condições e em situações específicas e que no conjunto transmitem o valor humano temporal.

A força do seu fabrico, os afectos e as imagens que transmitem, as visões que nos criam, os sentimentos que desenvolvemos por elas devem dar-nos a força necessária, para as conhecer, conservar, coleccionar, inventariar e divulga-las, de modo que a sua existência seja projectada para a eternidade.   

Mesmo que possam ser peças que transmitam um fabrico inábil, menos profissional, eventualmente com motivos decorativos ou figurados menos adequados, ou mesmo de inferior qualidade técnica, há que compreendê-las, contextualiza-las e mantê-las vivas.

Geralmente as peças em faiança de uso utilitário comum, doméstico, possuem menor exigência a nível do seu fabrico, com menor qualidade, e consequentemente mais efémeras, mas são tão ou mais importantes que as de qualidade superior, pois trazem consigo ou evidenciam realidades precárias ocorridas, vivências e modos de estar muito diferentes dos actuais, por tudo isto é de superior valor e importância o saber conservá-las, estudá-las e dar a conhecer as mesmas, de forma sensata e com rigor.

Consideramos de elevada importância a conservação, o estudo e a divulgação de peças em faiança representativas das várias épocas, em especial do século XX, dos estilos decorativos, dos centros de produção, das fábricas, dos autores e oleiros ou decoradores, pois no seu conjunto constituem um lugar de encontro da história da Faiança em Portugal e consequentemente um pouco da história de Portugal.


Assim pensamos e assim tentamos proceder!

Conservando, estudando e divulgando a Faiança “menor” do Século XX.


Nota:
As imagens de Faiança que se exibem nesta postagem foram retiradas de vários sítios de venda e de leilões, de modo a ilustrar um pouco o que se disse.