sábado, 25 de abril de 2015

Faiança: Cavalinho, “puro” FLS


Muito provavelmente o motivo “Cavalinho” ou “Estátua”, com raízes no motivo Inglês, original “Grecian Statue”, foi o mais reproduzido de sempre, quer em quantidade, e lembramos-mos da Fábrica de Louça de Sacavém, quer em diversidade, pelas diversas outras fabricas que produziram o mesmo.


Posteriormente, e após a estampagem, começaram-se a fabricar outras “réplicas” mais populares e mais ao gosto do artista, por vezes com decorações ingénuas ou mais rudimentares, artisticamente, com recurso a desenho livre, a estampagem (aplicação de chapa recortada) e mesmo esponjados.


Mais recentemente, surgiram novas estampas do mesmo motivo, com outras tonalidades, mais esbatidas, como os casos dos pratos da Faiave, ou os que empresas como o IKEA ou as lojas chinesas comercializam.

E até já nas feiras de velharias, há alguns “comerciantes”, vendendo “gato por lebre” e tentam vender (e ainda vendem a incautos ou desconhecedores) reles réplicas actuais dizendo que são pratos motivo “Cavalinho” da fábrica de Sacavém.

Como redundância desta situação, à dias fomos almoçar a uma vila alentejana, num restaurante regional, com gastronomia característica da região, regularmente frequentado por estrangeiros, especialmente por espanhóis, e uma das “inovações” foi a apresentação de louça “cavalinho”, de produção recente e não muito laborada.

Mais “Cavalinho” deste, não!


Veio-me então a ideia de apresentar um mui antigo prato da Fábrica de Louça de Sacavém, com o motivo “Estátua” ou “Cavalinho”, na cor azul forte, com uma soberba e abrangente decoração, para se ver e apreciar a diferente o que de bom e belo se fazia e as simples e pobres réplicas que actualmente de produzem.


Parece-nos ser uma estampa bastante elaborada, ricamente preenchida com decoração na aba que se prolonga até ao covo e que muito se assemelhava ao modelo inglês similar produzido pela fábrica C. & J. Shaw, em que o cavaleiro é portador de uma lança e o pedestal exibe quatro figuras.


Para além disso a decoração da aba é soberba, com três reservas dentro das quais se apresentam estampas de castelos e palácios; reservas estas intercaladas, por outras reservas decoradas com frontões, grinaldas e flores.


O prato que reproduzimos, pela marca que possui, é dos mais antigos fabricados pela Fábrica de Louças de Sacavém.


De acordo com a fonte (5), será do período de fabrico compreendido entre 1870 e 1880,


Este sim, é um dos pratos, “puros” do motivo “Cavalinho” ou “Estátua”, da Fábrica de Louça de Sacavém.

FONTES:

1) – “Fábrica de Louça de Sacavém – Contribuição para o estudo da indústria cerâmica em Portugal 1856-1974” de Ana Paula Assunção, Coleção História da Arte – Edições INAPA – 1997;

2) – “150 Anos – 150 Peças – Fábrica de Loiça de Sacavém” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Março de 2006;

3) – “Porta aberta às memórias” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2008;

4) - “Porta aberta às memórias” – 2ª edição, Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2009;

5) – “Dicionário de marcas de faiança” de Filomena Simas e Sónia Isidro, da Estar Editora, Lisboa – 1996;


7) - http://mercadoantigo.weebly.com/sacavem.html

sexta-feira, 17 de abril de 2015

TRAVESSA EM FAIANÇA AZUL E BRANCA, MOTIVO “ROSELLE”, FABRICO DO NORTE? IMITAÇÃO DE MIRAGAIA?

As peças em faiança azul e branca, antigas, carcomidas pelo tempo, são um fascínio para todos nós, amantes desta arte decorativa.


E quando a sua decoração é exuberante, com motivo conhecido ou não e com fabrico desconhecido, por não ter qualquer marca ou identificação, colocam-nos a tentar desvendar o mesmo, pelo que ainda maior é o fascínio por essas peças.


Apresentamos hoje uma interessantíssima travessa, em Faiança Azul e Branca, muito antiga, já um pouco “cansada” pelos anos, mas com um motivo que conseguimos identificar “ROSELLE”.

Travessa em faiança portuguesa do final Século XIX, ou início do XX. Peça moldada, de formato oval, recortada, monocroma e vidrada. Apresenta decoração monocromada a azul e branco: paisagem de um casario (chalet) com arvoredo e o que se presume ser um lago, em decoração esponjada, estampilhada e a traço à mão livre a azul.

No limite da aba possui um filete grosso, em azul forte, feito à mão pelo artista, denotando-se a sua imperfeição e traço não firme, o qual é secundado, para o interior, por uma calota esponjada num azul mais claro.


Na continuação da decoração da aba em direcção ao covo da travessa há uma cercadura de cornucópias, que constituem um conjunto decorativo repetitivo e aplicado por estampilhagem – com recurso a uma chapa recortada, num tom forte de azul.

O covo da travessa encontra-se praticamente todo preenchido: à direita, em desenho livre, com partes estampilhadas e esponjadas, o chalet, de vários pisos, com cobertura triangular, de duas águas, de pendentes bastante inclinadas, com duas chaminés decorativas e um vasto arvoredo envolvente; ao centro uma vasta área esponjada que será, provavelmente a representação de um lago, com umas nuvens, altas, no horizonte; e à esquerda, um imponente arvoredo, com trancos e ramos estampilhados, em tom de azul forte e as ramagens esponjadas, algumas com recorte a pincel, em tons de azul mais forte.


Quer no covo da travessa, quer no seu tardoz, denotam-se as três falhas do vidrado devido à aplicação da trempe, quando a peça foi cozer o vidrado.


No tardoz denota-se um esmalte leitoso, por vezes irregular e onde se realça tonalidades azuis, que parecem ter trespassado da decoração da aba e do covo.

Trata-se de uma decoração desenvolvida em Portugal, como interpretação livre e popular, ao gosto do artista e inspirada no motivo inglês, padrão "Roselle", "que é composto por um romântico chalet e uma árvore, que ladeiam um lago, onde se avista ao longe um castelo. Roselle é o nome de uma localidade italiana no Sul de Florença, que era um ponto de escala do chamado Grand Tour", tal como refere o Luís Montalvão, no seu blogue  http://velhariasdoluis.blogspot.pt/; (8).
 
(Caneca inglesa com padrão "Roselle", fabrico da John Meir & Son, apresentada na fonte 8)
Igualmente na mesma fonte (8), é afirmado que: "Em Portugal, segundo aprendi com o mercador veneziano, O Roselle foi copiado pela Fábrica de Massarelos. Foi também adaptado de forma popular por um fabricante que  algumas leiloeiras identificam como Vilar de Mouros e outras por loiça de Coimbra.", o que em certa medida vem confirmar o padrão da nossa travessa.
 
(Travessa em faiança nacional com motivo inspirado no padrão inglês "Roselle", exibida na fonte 8)
O motivo inglês “Roselle” foi produzido pelo fabricante JOHN MEIR & SON, na segunda metade do século XIX, período durante o qual a faiança inglesa dominou o mercado europeu pelo que os seus motivos serviram de inspiração aos fabricantes de todo o continente, e como não podia deixar de ser, a Portugal, reforçada pela “aliança” existente.



Fábricas como Alcântara, Massarelos e outras do Norte, não identificadas, produziram faianças com este motivo. A Fábrica de Massarelos produziu muitas peças com este motivo, por estampagem, das quais várias estão reproduzidas na fonte (14).

Para melhor identificação do motivo apresentamos algumas imagens de peças inglesas, com este motivo “Roselle”.




Por outro lado, atribui-se com frequência o fabrico de faianças com este motivo a “Vilar de Mouros”, se for em tonalidades verdes e a “Coimbra” ou mesmo “Alcobaça”, se doutras tonalidades.

A nossa travessa não suscita dúvidas, será certamente fabrico de uma das fábricas do Norte, eventualmente próximo de Porto, mas que não conseguimos identificar.

Será uma imitação da decoração de “Miragaia” ? ou de “Santo António do Vale da Piedade” ?

A incógnita mantém-se, mas a peça em faiança Azul e Branca, vale por si só, mesmo sem se conhecer o seu fabrico.


FONTES:

1) – “Faiança Portuguesa Séculos XVIII-XIX”, Colecção Pereira de Sampaio, Editores ACD, 2008.

2) – “Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, Organização, Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da Rocha Pinto, Editorial Presença, 3ª Edição, Lisboa, 1987.

3) – “Faiança Portuguesa – Seculos XVIII-XIX”, de Arthur de Sandão, Livraria Civilização, 2º Volume, Barcelos, 1985.

4) – “Cerâmica Artística Portuense dos Séculos XVIII e XIX”, Vasco Valente, Livraria Fernando Machado – Porto,

5) – “Cerâmica Portuense – Evolução Empresarial e Estruturas Edificadas”, Teresa Soeiro, Jorge Fernandes Lacerda, Silvestre Lacerda, Joaquim Oliveira, Edição Portugália, Nova série, volume XVI, 1995.

6) – “Fábrica de Louça de Miragaia”, Museu Nacional Soares dos Reis, Edição IMC, Lisboa, 2008.





11) – “Fábrica de Massarelos - Porto, 1763 – 1936”, Coordenação de Mónica Baldaque, Teresa Pereira Viana e Margarida Rebelo Correia, edição do Museu Nacional Soares dos Reis, 1998.



14) – “A Fábrica de Louça de Massarelos – Contributos para a caracterização de uma unidade fabril pioneira”. Volume 1, dissertação de Mestrado em Estudos do Património, de Armando Octaviano Palma de Araújo, Universidade Aberta, Lisboa, 2012.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Saladeira Falante com decoração de esponjados – Fabrico de Aveiro (?)

As peças falantes, em faiança, são sempre algo de interessante, em especial dos dizeres que transmitem.


Peças em faiança, com decoração de esponjados e carimbos, falantes, é algo que ainda não tínhamos visto.

A ingenuidade da saladeira falante que apresentamos é notória “Pode ir ao Forno” – evidenciando a sua dupla função utilitária doméstica.


Cremos tratar-se de uma peça fabricada numa das muitas fábricas de Aveiro, em meados do século passado, com a decoração de esponjados, escorridos e circulares – a “aplicação da rolha”, policromados (azuis, amarelos-ocre, avermelhados); esponjados esverdeados e com remates em triângulos, ou “bicos”, na cor azul, junto à bordadura, quer interior, quer exterior, bem assim como no limite da base ou fundo.


A decoração de esponjados é no interior e no exterior da terrina, sendo que no interior se prolonga até ao fundo da saladeira, deixando só espaço para a decoração “falante”: “Pode ir ao Forno”.


No tardoz possui um frete, o que nos leva a considerar que se trata de uma peça da região de Aveiro, pois este elemento era característico desta zona.

Trata-se de uma decoração simples e rápida de efectuar, com a execução manual dos “bicos” e com a aplicação dos esponjados, com uma esponja provavelmente do mar e dos “círculos”, com uma rolha.
 

A rapidez e o “descuido” colocado na decoração destas peças “baratas” e de uso utilitário comum e frequente, justificava que habitualmente no tardoz ou base das mesmas, aparecessem borrões coloridos, correspondendo a alguns dos dedos do decorador, sujos de tinta da decoração efectuada.

 

Mas a decoração, mesmo ingénua, era interessante e “deslumbrante” para uma louça barata e de uso corrente.


Quando as peças não apresentam os remates em “bicos” ou triângulos, mas sim com um filete largo, atribui-se o seu fabrico à Fábrica da Corticeira do Porto (mas sem certezas). Exemplo disse é a saladeira em exibimos a seguir.


As Faianças Falantes geralmente possuíam frases de votos a noivos “Parabéns aos Noivos”, “Vivam os Noivos”; à noiva e à esposa; “Amo-te muito”;  ou com “dizeres brincalhões”: És Má”, “Gostas de mim?”, “Alto que é jesuíta”, “Ilusões de Infância”, mas com indicações utilitárias é a primeira vez que detectamos “Pode ir ao Forno”.


Aqui fica o registo de mais uma interessante peça de faiança, provavelmente de uma das fábricas de Aveiro, com uma decoração esponjada falante.

Por oportuno reparo da Isa Coy, apreciadora de faianças como nós, corrigimos a denominação da peça que apresentamos, pois é mais uma ASSADEIRA, de que uma SALADEIRA - aqui fica a correcção (2016.02.16).

FONTES:



quinta-feira, 9 de abril de 2015

Prato de Sacavém do Motivo 172, com carimbo do Motivo Estátua: Um enigma!

Prato de Sacavém do Motivo 172, com carimbo do Motivo Estátua: Um enigma!


Já anteriormente apresentámos um prato com este motivo decorativo (1) – o Motivo 172, pese embora, por vezes já tinha sido referenciado, incorrectamente, como o Motivo “Paz” (2).


Trata-se de um prato com uma decoração não muito corrente e pouco comum da Fábrica de Louça de Sacavém, que possui uma soberba decoração monocroma, estampada na aba, com uma interessante decoração na bordadura da aba e um filete grosso no limite do covo, que se interrompe e se  liga à decoração da aba; na cor azul-escura.


É um prato do período “GILMANS & C.ª”, (1905-1973), provavelmente de fabrico da década 30 ou 40 do século passado e possui no tardoz o carimbo, na cor negra, correspondente ao período, com identificação errónea do motivo “ESTÁTUA” e com uma marca numérica na pasta: “SACAVEM” e “52-CK”.





Possui ainda dois caracteres figurativos, na cor preta: “uma circunferência com o centro” e outro indecifrável “?”.

Eis pois o enigma: qual a razão por que este prato tenha sido identificado com o motivo “ESTÁTUA”, quando toda a gente conhece esse motivo e de imediato detecta esse erro?


Alguém conseguirá explicar esta ocorrência?

Do outro prato, do mesmo motivo decorativo 172 e já apresentado noutra postagem exibimos algumas imagens do mesmo, para comparação com o que agora apresentamos.





FONTES:




3) – “Fábrica de Louça de Sacavém – Contribuição para o estudo da indústria cerâmica em Portugal 1856-1974” de Ana Paula Assunção, Coleção História da Arte – Edições INAPA – 1997;

4) – “150 Anos – 150 Peças – Fábrica de Loiça de Sacavém” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Março de 2006;

5) – “Porta aberta às memórias” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2008;

6) - “Porta aberta às memórias” – 2ª edição, Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2009;