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quarta-feira, 31 de agosto de 2016

PRATO SOPEIRO, GRANDE, MOTIVO ESTÁTUA, COR-DE-ROSA, FABRICA DAS LOUÇAS DE DEVESAS, DE JOSE PEREIRA VALENTE


Provavelmente o motivo mais reproduzido nas faianças em Portugal, foi o “Estátua”, vulgarmente conhecido como “Cavalinho”, tenso tido a principal e preponderante produção na Fábrica de Louças de Sacavém; mas muitas outras a imitaram ou com ela concorreram, com decorações muitos semelhantes, umas mais trabalhadas, mais ricas; outras mais singelas e pobres.

(Figura 1 - A peça em apreciação)

Quando encontramos peças com esta decoração o principal interesse é a pesquisa de diferentes decorações, para o mesmo motivo ou outros centros de produção.

(Figura 2 - A decoração motivo da peça)

Todos sabemos que, por exemplo, o cavaleiro, ou cavaleiro, e o seu cavalo, possuem várias exposições, olhares diferentes, acessórios de guerra ou honra diferentes; pedestal e colunas variadas; lago, rio e castelos ou palácios muito diferentes e diversificados, ou mesmo a decoração vegetalista, mais vasta ou mais rala, na aba, que por vezes até se prolonga para o covo

(Figura 3 - A soberba decoração vegetalista da aba)

A diferença nesta peça – um prato sopeiro, de acentuado covo, de generosas dimensões, bastante superiores ao habitual, é a origem do seu fabrico ou centro de produção: mais uma fábrica que rivalizou, ou tentou concorrer, aproveitando a fama e o sucesso comercial, da Fábrica de Louças de Sacavém: a Fábrica de Louças das Devesas, de José Pereira Valente.

(Figura 4 - A decoração das cartelas na aba, com palácios e castelos)

Para além das suas anormais dimensões, bastante superiores às habituais, este prato covo, possui uma intensa e rica decoração na aba, com três reservas, preenchidas por palácios com torres de menagem e com duas pirâmides, no horizonte e mais uma edificação acastelada, para além da habitual decoração no covo.

Decoração monocromática, em cor-de-rosa.

(Figura 5 - O tardoz do prtao)

Prato robusto, pesado, com covo acentuado de tardoz, com um frete exterior significativo e mais dois interiores, mais esbatidos e no círculo central, o carimbo correspondente ao fabrico; e identificando-se três conjuntos de três pontos, das trempes, quando foi a vidrar, junto ao frete, para o seu interior.

(Figura 6 - O carimbo na peça identificando o seu fabrico)

Presume-se que o seu período de fabrico deve ser por volta de 1900 (início do século XX).
Sendo, para nós, o interesse deste prato a sua origem de produção, vamos pois, dedicar-nos um pouco à sua unidade de produção – Fábrica de Louças das Devesas, de José Pereira Valente, como a sua marca o identifica de forma inequívoca, com o nome VALENTE, a encimar a marca.


Um pouco de história da Fábrica

Trata-se uma fábrica pouco conhecida e que se confunde frequentemente com a Fábrica de Cerâmica (e de Fundição) das Devesas, em Gaia, mais tarde, Companhia das Cerâmicas das Devesas, esta fundada em 1865 por António Almeida da Costa, onde José Pereira Valente trabalhou, até fundar a sua empresa; a qual laborou segundo consta até 1946. Mas há quem a prolongue até à década de 60 (será ?)
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A partir de 1884, a fábrica instala-se na Rua Dona Leonor, também em Vila Nova de Gaia e nas imediações da fábrica de António Almeida da Costa.

José Pereira Valente teve sempre a ajuda de António Almeida Valente, seu antigo patrão, no que respeita ao escoamento dos produtos, o que o levou a adquirir, em 1891, uma máquina que permitiu ampliar a produção, começando até a produzir azulejo. 

Na primeira década do século XX a gerência amplia-se com a entrada de familiares.

Em 1904 esta empresa passou a adoptar a designação José Pereira Valente, Filhos; sociedade que se veio a dissolver-se em 1915, aquando da retirada de dois dos quatro herdeiros de José Pereira Valente, mais precisamente de José Pereira Valente Júnior e Augusto Pereira Valente, os quais receberam o dinheiro do investimento efectuado. Os outros dois irmãos, Júlio Pereira Valente e Feliciano Pereira Valente assumem assim as responsabilidades da fábrica.

Neste mesmo ano, devido à necessidade de expansão e ao período de guerra, dá entrada um novo sócio, Joaquim Moreira Gandra da Fonseca, constituindo-se a firma Valentes & Moreira.

Apesar das sucessivas alterações na constituição da sociedade, com a saída de Júlio Pereira Valente, em 1918, e o falecimento de Feliciano Pereira Valente, em 1946, a empresa parece ter sobrevivido até à década de 1960.

A família Pereira Valente esteve ainda ligada à Fábrica do Cavaco, pois em 1 de Agosto de 1936 Luciano Pereira Valente constituiu sociedade com António Augusto Fragateiro Júnior e Manuel Rodrigues Ferreira da Costa para adquirir a fábrica, que ficou com um capital social de 15.000$00, equitativamente repartido pelos sócios.
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Cerca de dois anos depois, em 28 de Novembro de 1938, Luciano Pereira Valente, que desempenhava as funções de gerente técnico, adquiriu a António Augusto Fragateiro Júnior a sua participação nessa empresa.

A decadência desta fábrica dá-se em simultâneo com a das Devesas, reduzindo drasticamente a sua produção, na segunda década do século XX e até ao seu encerramento. 

No seu progressivo declínio estão problemas relacionados com a estrutura familiar da empresa.


Caracterização sumária da sua produção desta

A Fábrica de Louças das Devesas, de José Pereira Valente, produzia faiança com soberba decoração e era considerada como uma das melhores fábricas de faiança do Norte, rivalizando, em termos de qualidade com a Fábrica de Louças de Sacavém.

(Figura 7 - Outra peça - prato semelhante ao nosso)

Por outro lado, esta fábrica, de Pereira Valente, foi uma fábrica imitadora, especialmente do estilo da Fábrica de Cerâmica das Devesas, mas também da Fábrica de Louças de Sacavém. Porém, conseguiu imitar com resultados, por vezes, melhores que os modelos originais, com mais qualidade.

(Figura 8 -O carimbo da peça anterior)

A Fábrica Pereira Valente foi sobretudo incontornável ao nível da produção de vasos, pinhas e globos de remate, assim como estátuas para fachadas, rivalizando com outras fábricas existentes à época, também no Norte (Gaia e Porto).

(Figura 9 - Um carimbo variante da Fábrica de Pereira Valente)

Aliás, a própria fachada da fábrica era encimada por uma estátua, a qual terá sido retirada na década de 1980 ou inícios da década seguinte, já depois de a fábrica ter encerrado (há alguns anos atrás era uma oficina de automóveis).

(Figura 10 - Outro carimbo da Fábrica de Pereira Valente)

A fachada subsistente da Fábrica Pereira Valente deverá datar da viragem do século XIX para o século XX. Embora não seja totalmente revestida a azulejos e não possua particulares qualidades arquitectónicas, ela apresenta artefactos de cerâmica muito raros

(Figura 11 - Outro carimbo da Fábrica de Pereira Valente)

A Fábrica Pereira Valente também produziu azulejaria, especialmente nos períodos Arte Nova e Art Déco, embora tenha tido dificuldade em concorrer com outras fábricas já mais implantadas no mercado

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Concluindo

A Fábrica de José Pereira Valente, das Devesas, é sem dúvida um marco histórico-documental importante, já que foi uma das fábricas de maior qualidade na produção de artefactos cerâmicos para decoração da arquitectura, bem assim como de louça em faiança de uso doméstico corrente, com superior decoração.


FONTES:


2) – “A Cerâmica Portuense – Evolução Empresarial e Estruturas Edificadas”, de Teresa Soeiro, Jorge Fernandes Alves, Silvestre Lacerda e Joaquim Oliveira; Edição Portugália, Nova Série, Volume XVI, 1995.

3) – “Dois séculos de Faiança Portuguesa”, de Edgar Vigário, trabalho do autor, Setembro 2015,





8) - “Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, com Organização, Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da Rocha Pinto, Editorial Presença – 3ª Edição – 1987;