Nestes dias cinzentos, frios e
chuvosos, apanágio da severidade do Inverno, temos o tempo necessário para
consultar alguns livros e relê-los.
Nada melhor que a primeira “Bíblia” da
cerâmica – como não podia deixar de ser estamos a referir-nos à “CERAMICA
PORTUGUEZA” de José Queiroz, edição de 1907 – Lisboa (1ª Edição), cujo depósito
da mesma era na Livraria Coelho, na Rua Augusta, 151 e 153.
Livro que dispensa comentários e que
todos já ouviram falar!
O possuir a 1ª edição deste livro é um
superior prazer!
Desde logo a sua capa é interessantíssima,
fazendo referencia às Padroeiras dos Oleiros Portugueses, as Santas Justa e
Rufina.
Consta que Santa Justa e Santa Rufina,
irmãs, naturais de Sevilha (Espanha), onde nasceram e faleceram, no ano de 287
(D.C.), pertenciam a um povo pagão, e não prestavam culto a ídolos impostos à
época, já que tinham uma inabalável fé cristã.
Pertenciam a uma família pobre, o pai era um oleiro andaluz, cuja sobrevivência era a venda de louça de barro nas feiras.
Ao que consta, segundo a lenda,
estando as mesmas uma vez na sua barraca de venda de louça, viram aproximar-se
uma procissão que trazia muitos ídolos, que o povo venerava e respeitava, mas
que se recusaram a idolatrar os mesmos. Sendo segundo a lenda, o deus Adónis e
a deusa Vénus.
Quebraram-lhes as louças que vendiam e o
governador, enfurecido com a postura das mesmas, deteve-as, submeteu-as a medonhos
castigos e torturas, levando-as até à morte. Santa Justa foi morta sobre a roda
e Santa Rufina estrangulada.
Em sinal da sua coragem e da fé cristã,
que nunca renegaram, estas duas irmãs começaram a ser faladas, conhecidas e
veneradas pelos oleiros, vindo mais tarde a ser consideradas as suas
padroeiras.
Deixemos a lenda e voltemos ao livro: trata-se de um grande trabalho
publicado sobre a cerâmica portuguesa, com um caracter científico, histórico e
de elevado impacte em todas as análises e estudos efectuados posteriormente,
isto é, após 1907, mantendo ainda a sua fundamental importância e actualidade.
E porque não, mais uma vez rever o que
foi escrito em 1907, com base em muitos textos, escritos e informações à época
e das décadas anteriores, para tentar desvendar algo mais sobre o Ceramista
José dos Reis (dos Santos) fundador de uma cerâmica em Alcobaça, em 1875 (?), após
vir de Coimbra, onde era mercador de louça (?) – aqui a dúvida.
Mas vejamos o que nos diz à época
(1907) José Queiroz:
“FÁBRICA DE ALCOBAÇA – 187…
Fundada
por José dos Reis, pouco mais ou menos n’esta data. Este Reis faleceu em 1897,
tomando o seu lugar na fábrica Manuel ferreira Bernarda Júnior, que a alugou à
filha do fundador, três anos depois da morte d’este industrial.
Produz
louça entre ordinária e fina – no género de Coimbra – pintada à mão e
estampilhada. Usa, entre outros barros, o branco da localidade.
Atualmente,
dirige a fábrica Joaquim dos Santos (Pequeno). Pintor: Francisco Ferreira.
Emprega oito operários.
Fornece
os mercados de Alcobaça e Praia da Nazaré.
Na
fábrica existe um prato datado 15-8-75 e em que se lê o nome da localidade por
extenso: Alcobaça.
Esta
peça é pintada a azul, verde, amarelo e roxo, e o tipo de decoração é muito
semelhante ao que, no século XVIII, ornamentava as louças Bica do Sapato e de
Estremoz”.
Não há mais nenhuma referência a José
dos Reis, nem ao período anterior em Coimbra quando era mercador de louça, segundo consta e muito menos como oleiro ou proprietário de uma fábrica de louça.
Noutra passagem, importante, deste
livro, é feita uma resenha das fábricas contemporâneas (1800-1900) de Coimbra,
em que são referidas, nomeadamente as seguintes:
“ 1800-1889 – José Augusto da Fonseca
& Filho – Retiro das Lages. Louça branca.
1810 – 1873 – José António dos Santos –
Rua da Moeda. Louça branca.
1810 – 1867 – João Augusto da Fonseca –
Rua de João Cabreiro. Louça branca.
1820 – 1870 – Leonardo António Veiga –
Rua de Simão de Évora. Louça branca.
1820 – 1887 – Virgílio Marão Pessoa –
Terreiro de Santo António. Louça branca.
1835 – 1887 – António Gonçalves de
Campos – Rua da Moeda. Louça vermelha.
1840 – 1867 – Adriano Augusto Pessoa –
Terreiro de Santo António. Louça vermelha.
1845 – 1903 – Adelino da Cunha Moura –
Rua Direita. Louça vermelha.
1863 – 1875 – João António da Cunha – Largo
das Olarias. Louça vermelha.
1890 – Adriano Augusto Pessoa – Rua da
Moeda. Louça vermelha.
1898 – Cardoso de Ladeiro – Rua de João
Cabreiro. Louça vermelha.
1899 – Serrano da Fonseca – Estrada da
Beira. Louça Vermelha.”
Concluímos assim não haver qualquer
informação, neste livro tão importante, que refira, identifique ou indicie
qualquer actividade de José dos Reis, em Coimbra com uma fábrica de louça.
Na verdade até hoje só conseguimos
identificar a fabricação de José dos Reis (dos Santos) em Alcobaça e no período
entre 1875 e 1897 – (ano do seu falecimento).
Fontes:
1) - “Cerâmica Portuguesa”, de José Queiroz, Depósito: Livraria Coelho, 1ª Edição, Lisboa, 1907;