A Faiança Azul e Branca é
sempre um misto de contemplação e deslumbramento.
Figura 1 - A nossa peça em apresentação |
O formato da peça, a sua
decoração, a arte na pintura, a cor e os escorridos do vidrado, permitem-se
tecer considerações, explanar conjecturas, mesmo sem saber quem a fabricou, qual
a fábrica ou o simples local onde foi produzida, qual a localidade ou mesmo a região
da sua manufactura e qual a época de produção.
Figura 2 - A exuberante decoração do fundo do prato com o motivo "Challet" ou "Roselle" |
Independentemente de tudo
isto, e não indo na fácil leviandade de conjecturar que é fabrico “daqui”, da
fábrica “tal” e do período “x”, que se assemelha ao fabrico “y”, será muito
mais correto, na nossa óptica, contemplar a e descrever a mesma.
Os segredos que a peça encerra,
por si só, para que as aprecia, as gosta de ver ou mesmo coleccionar, cria uma auréola
de encanto, de deslumbramento e de entusiasmo para tentar “ver ou ler”, para
além da mesma e do seu encanto.
Em que condições foi efectuada?
Qual o espírito e devoção de quem a fabricou e a pintou? Em que época, período
ou tempo foi efectuada? Quem a teria adquirido? Em que casas andou? Como
conseguiu sobreviver até ao presente? O que teria visto e apreciado em todo este
tempo até ao presente?
Esta que exibimos hoje, após
um longo período de interregno, não por falta de peças para apresentar, mas de
tempo para as divulgar, constitui, sem dúvida, uma cativante e interessante
peça, com soberba decoração.
Figura 3 - A beleza da decoração do prato |
Trata-se de um prato covo,
sopeiro, relativamente pequeno – antigamente os pratos, quando utilizados
individualmente, eram mais pequenos em diâmetro, pois pratos maiores como
malgas ou palanganas, eram usadas para toda a família – todos comiam da mesma
“o caldo com a broa”, ou as “sopas”, já que o conduto era colocado sobre uma
fatia de pão.
Figura 4 - A decoração da aba do parto |
A bordadura da aba é
recortada, com uma pequena ondulação, que lhe confere logo uma singela beleza.
São lóbulos pequenos e arredondados.
No entanto algo particular,
interessante e relativamente raro é a concordância que há entre a aba e o covo,
onde se cria uma coroa circular, plana, com um ligeiro relevo junto do covo, o
qual por si, tem depois o desenvolvimento habitual até ao fundo do prato
Figura 5 - Pormenor da decoração da aba |
.
A decoração também é
interessante e intensa, preenchendo bem o prato. Começa com um filete espesso
na bordadura a aba, de cor azul, e por outros dois filetes, mais finos, no
limite interior da aba, antes de estabelecer a concordância com o covo.
A aba possui interessante
decoração, entre os filetes referidos, com várias reservas em forma alongada, dentro
das quais se insere uma espessa decoração em azul muito forte, que se pode
identificar como um sol a pôr-se no horizonte, com uma sobreposição
“areoglifica”, que não conseguimos identificar, nem contextualizar de outra
forma. O espaço entre as cartelas é preenchido com ornato em quadrícula,
também na cor azul, e irregular, ao jeito e “precisão” da mão do decorador.
Figura 6 - Pormenor da decoração das reservas da aba do prato |
O fundo do prato começa
também com um largo filete, que delimita a sua soberba e deslumbrante decoração,
igualmente em tons de azul forte, o dito azul-manganês.
O motivo é recorrente,
assemelhando-se ao dito motivo “Roselle”, ou “Challet”, em que a decoração
exibe o alçado principal de uma edificação “apalaçada”, de cobertura com
acentuada inclinação, exibindo dois níveis de fenestração, com uma torre, num
dos lados, a qual possui vários vãos de fenestração.
Figura 7 - A decoração "Challet" ou "Roselle" no fundo do prato |
O “Challlet” possui quatro
mastros com bandeiras ou flamas (?), sendo o mesmo ladeado por intensa
vegetação com duas frondosas árvores, uma de cada lado, que se iniciam num
embasamento de enquadramento.
Figura 8 - Pormenor da Decoração no fundo do prato |
Em termos de decoração
parece-nos que foram usadas três técnicas, o ”stencil” ou chapa recortada, para efectuar as árvores e eventualmente o beirado do “challet”; o esponjado, para efectuar o embasamento de enquadramento do “challet”, bem como assim o sombreado
de parte do mesmo e a vegetação no horizonte; finalmente o pincel, com a
decoração manual, onde o decorador evidenciou os seus dotes e gostos, imprecisões e desalinho do pincel e da sua mão.
Figura 9 - Tardoz do prato |
Em termos de materiais,
denota-se que a pasta é ligeiramente cor de grão, espessa, e por isso, um prato
pesado para o tamanho; o vidrado é leitoso, com alguns arrepiados e
escorrências (no tardoz), para além de algumas esborratadelas a azul, das mãos
ou do apoio quanto o decorador esteve a pintar o prato.
Figura 10 - Pormenor do tardoz do prato |
Resumindo trata-se de uma
interessante peça em faiança azul e branca, pouco vulgar em termos de formato,
com decoração característica e identificada, já com muitos anos…., e digna de
se apreciar.
Independentemente do que se
disse inicialmente, e caso não indicássemos algo em relação ao fabrico, origem
e época de peça, considerariam, eventualmente, uma postagem incompleta.
Figura 11 - Mais uma imagem do magnifico prato em apresentação |
Sem mais delongas,
alvitram-se as seguintes indicações: fabrico do Norte, de alguma das muitas
fábricas existentes no Porto ou em Gaia, sugerir alguma, não nos atrevemos; do
período que poderá variar entre o final do século XIX e inícios do século XX,
será?
FONTES:
1) –
“Faiança Portuguesa Séculos XVIII-XIX”, Colecção Pereira de Sampaio, Editores
ACD, 2008.
2) –
“Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, Organização,
Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da Rocha
Pinto, Editorial Presença, 3ª Edição, Lisboa, 1987.
3) –
“Faiança Portuguesa – Seculos XVIII-XIX”, de Arthur de Sandão, Livraria
Civilização, 2º Volume, Barcelos, 1985.
4)
– “Cerâmica Artística Portuense dos Séculos XVIII e XIX”, Vasco Valente,
Livraria Fernando Machado – Porto,
5)
– “Cerâmica Portuense – Evolução Empresarial e Estruturas Edificadas”, Teresa
Soeiro, Jorge Fernandes Lacerda, Silvestre Lacerda, Joaquim Oliveira, Edição
Portugália, Nova série, volume XVI, 1995.
6)
– “Fábrica de Louça de Miragaia”, Museu Nacional Soares dos Reis, Edição IMC,
Lisboa, 2008.
7)-
https://
velhariastralhasetraquitanas.blogspot.pt/2015/04/travessa-em-faiança-azul-e-branca-motivo-“roselle”-fabrico-do-norte-?-imitação-de-miragaia-?.html;
8)
- https://velhariastralhasetraquitanas.blogspot.pt/2015/03/travessa-em-faianca-motivo-casario-de.html;
9)
- https://velhariastralhasetraquitanas.blogspot.pt/search/label/Motivo%20%22ROSELLE%22.html;