terça-feira, 18 de novembro de 2014

Prato da Fábrica Cerâmica da Madalena – Leiria


AO JEITO DE INTRODUÇÃO:

Na senda da identificação do maior número possível de peças de loiça utilitária doméstica produzida em Portugal, vamos agora referenciar uma fábrica da zona de Leiria: a Cerâmica da Madalena, que produziu as louças de uso doméstico MADALENA.


A peça que catalogamos é um prato raso da fábrica Cerâmica da Madalena, de faiança fina, com aba recortada e uma decoração simples, constituída por três filetes: um fino a meio da aba, na cor castanho claro, um mais grosso quase no limite da aba para o covo igualmente castanho claro e outro, mais largo, na cor azul marinho no limite da aba para o covo do prato, e com o característico carimbo da fábrica, na cor castanho claro.


Trata-se de uma peça cujo fabrico ocorreu, provavelmente, na segunda metade da década de 50 ou primeira da de 60 (até 1964).



UM POUCO DE HISTÓRIA:

A Fábrica Cerâmica da Madalena localizava-se em Leiria, mais propriamente junto à Ponte da Madalena, e daí o nome da fábrica, a qual foi fundada a 31 de Julho de 1945, por Manuel António Pinto, então com 29 anos, aproveitando um dos momentos marcantes na indústria cerâmica Nacional.

Tratava-se do período pós 2.ª Guerra Mundial (1939-45), na altura em que o mercado americano se abre ao consumo de produtos cerâmicos feitos na Europa e consequentemente em Portugal e assim o comércio internacional traz um impulso à produção nacional, nomeadamente das faianças e Manuel António Pinto soube aproveitar tal oportunidade.

Por outro lado, Portugal também saía de um período, economicamente, mais difícil e consequentemente o consumo iria aumentar.

Um desentendimento entre os sócios da Cerâmica Madalena, em 1951, provocou que a mesma fosse arrendada a António Freitas, o qual se limitou a gerir a mesma, produzindo, não a modernizando e consequentemente deixando-a ficar, quer a nível de instalações, quer de equipamentos, desgastada e obsoleta.

Anos depois, após cessar o arrendamento de António Freitas, a mesma foi gerida por Manuel António Pinto, seu fundador e por Manuel Barbeiro Costa, até 1964, já que em Setembro a sociedade dos mesmos foi dissolvida.

Passou então a ser gerido por José Ferreira Dias, até 1970, sendo que a fábrica só produziu louça doméstica até 1968, tendo nesse ano iniciado a produção de louça sanitária e no ano seguinte a produção de azulejos e tijolo refractário.

Em Abril de 1970, José Ferreira Dias constitui uma nova sociedade, a Nova Cerâmica da Madalena, com sede em Queluz, que para além dele, passa a ter mais três sócios, um deles a conhecida empresa J. Pimenta (Empreendimentos Urbanos e Turísticos J. Pimenta, Lda.).




Anos volvidos, mais precisamente em 1977, a sede da empresa passa novamente para Leiria e um ano mais tarde passa a sociedade anónima.

Nesta época a produção era muito deficiente: sem planeamento, sem controlo a todos os níveis, com níveis de produção muito baixos, com o recurso a métodos retrógrados e sem medidas se protecção e segurança dos operários.

A empresa passou por um período difícil e conturbado, estabilizando a partir de 1988, a partir da mesma ter sido adquirida, pela ROCA, S.A., (em 31/12/1987), e cuja denominação MADALENA acabou quatro anos depois, passando a ROCA.


A SUA PRODUÇÃO DE LOIÇA:

A produção prevista inicialmente era a de loiça doméstica utilitária e decorativa a partir do barro branco, mas acabou por adiar tal pretensão.

Tal produção assemelhar-se-ia à que à época se produzia em Coimbra, Aveiro e na Fábrica de louça de Sacavém, na região de Lisboa.

Começou pois a produzir peças tradicionais em barro vermelho, com o recurso a um oleiro da localidade da Bajouca, um dos principais centros oleiros da região, onde a actividade de olaria era intensa e importante, com especial relevo para a Olaria da Bajouca.

Alguns anos mais tarde iniciou então a produção de louça de barro branco, tendo Manuel António Pinto contratado dois oleiros de Coimbra: Alexandre Soares e Luís Ribeiro.

Dedicava-se ao fabrico de loiça utilitária doméstica comum, em faiança, com maior consumo, na zona da Maceira e na de Leiria, como seria óbvio, dada a proximidade, pese embora não tenha deixado de chegar a grande parte de Portugal, concorrendo com outras marcas à época.

Trata-se de uma cerâmica de qualidade média, de custo acessível e com decorações ao gosto da época pelo que rapidamente se tornou muito popular, em especial na região.

A produção desta fábrica assemelhava-se à da Companhia de Fábricas de Cerâmica Lusitânia, em particular a Lusitânia de Coimbra.


OS SEUS MOTIVOS:

 As decorações da louça cerâmica doméstica da fábrica Madalena eram ao gosto da época.

Os motivos da loiça que produziu eram essencialmente florais, arranjos florais, policromáticos, com bastante incidência nas rosas, quer fossem pratos, travessas ou mesmos conjuntos de chá ou café.







Os arranjos florais geralmente eram articulados com linhas geométricas e com frequentes filetes dourados. Estas decorações assemelhavam-se ás utilizadas nas peças da Companhia de Fábricas de Cerâmica Lusitânia, em particular a Lusitânia de Coimbra e por vezes às da Fábrica de Massarelos.



Outro motivo interessante, com algumas variantes, baseado em cenas bucólicas, com o “Casal Romântico”, mais propriamente na década de 60, aproveitando a moda à época, em que outras fábricas também produziam este motivo. 





Este motivo fazia lembrar os quadros do pintor francês Fragornard, o romantismo francês, ao estilo Luís XVI, muito em voga na época





A figuração da louça utilitária/decorativa, apoiava-se também em motivos regionais nacionais, características das antigas províncias e dos seus trajes característicos. 




AS SUAS MARCAS CONHECIDAS:

Só se conhecem duas marcas com que todas as peças da Fábrica da Madalena de Leiria eram carimbadas.

A primeira, mais antiga e mais elaborada, tratava-se de um carimbo, na cor castanho claro ou verde-claro, que possuía um escudo onde se encontram inseridas as palavras MADALENA, LEIRIA  que contornam um círculo, dentro do qual está desenhado uma flor-de-lis (como registo do rio Lis, que passava junto à fábrica e em Leiria)   e sob o escudo encontra a palavra PORTUGAL.

Cremos que esta marca foi usada desde a fundação, em 1945 e até 1964.




A segunda marca, posterior, era muito mais simples, pois só possuía as palavras LEIRIA e MADALENA, geralmente na cor azul, cinzenta ou preta.

Cremos que esta segunda marca foi usada entre os anos de 1964 até 1968, ano em que se deixou de produzir esta marca de loiça utilitária doméstica.




FONTES:

1) – “História da Industria na Região de Leiria – Cerâmica”, Edição Jornal de Leiria, Edição n.º 1558, de 22.05.2014, Edição: Jorlis - Edições e Publicações, Lda.

2) - “Cerâmica – Reflexo de uma cultura – Catálogo de exposição”, (Exposição Representativa da Industria Cerâmica na Região de Leiria) – Paulo Bártolo, Lina Durão e Telma Margarida Ferreira, Editor IPL – Instituto Politécnico de Leiria, Leiria, Setembro de 2012.


6 comentários:

  1. É interessante que, sendo a minha família da zona de Leiria, e tendo passado vezes sem conta frente às instalações desta fábrica, nunca tenha dado conta que fabricavam loiça utilitária. Só conhecia esta fábrica como produzindo, tradicionalmente, produtos destinados à construção civil,.
    E, certamente, nas muitas casas que visitei nesta região, e onde acabei por comer igualmente muitas vezes, tenha sido servido em cerâmica desta fábrica, pois reconheço alguns dos padrões que aqui deixou, só que, nessa altura, não me interessavam, nem a história, nem a produção cerâmica em Portugal.
    É verdade que estas peças, ainda que tentando seguir padrões de gosto válidos na época em que foram produzidas, não têm grande interesse em termos estéticos ou mesmo de qualidade.
    No entanto, sendo nós um país com tanta e tão variada tradição cerâmica, fazem parte integrante da nossa história de produção neste campo - toda aquela região é rica na extração de argilas - e, afinal, não se pode ter uma história feita só com peças de grande qualidade e beleza; é forçoso que também exista uma outra produção, esta destinada a outros públicos, com outros graus de exigência, bolsa, e gostos diferenciados, que não são menos importantes por causa disso.
    Um bem haja por este esforço de catalogação, o futuro agradecerá
    Manel

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    1. Caro Manel,

      É verdade como diz, geralmente as coisas que diariamente nos passam à frente da vista não ligamos a elas e só mais tarde, quando alguém dos faz ver algo é que as recordamos com nostalgia.

      Tudo, tal como na cerâmica, é feito de coisas boas, menos boas e as possíveis, pelo que recordá-las e registá-las, antes que se apaguem da memória de todos nós e que deixem de existir as respectivas marcas e vestígios deve ser um dever nosso.

      É pois um prazer para mim registar e levar ao conhecimento geral, peças cerâmicas de fábricas "menores", mas que fizeram parte do quotidiano dos nossos avós, dos nossos pais e de alguns de nós quando pequenotes, para que os vindoiros, eventualmente, um dia revejam este passado das artes decorativas (cerâmica) de Portugal.

      Um abraço,

      Jorge Gomes

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  2. Vendo Prato raso e prato de sopa da fábrica de Cerâmica da Madalena.
    Pintura baseado em cenas bucólicas, “Casal Romântico”, inspirado nos quadros do pintor francês Fragornard,do romantismo francês, ao estilo Luís XVI, muito em voga na época. No verso tem o característico carimbo da fábrica, na cor castanho claro.

    Ver mais em: http://olx.pt/anuncio/antiguidade-2-pratos-da-fbrica-cermica-da-madalena-leiria-IDyye6r.html

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    1. Caro Sr. Walter Montalvão,
      Boa tarde,
      Felicito-o por ser proprietário de peças em Faiança da Fábrica de Cerâmica da Madalena, deveras interessantes, como eu as descrevi nesta mensagem do meu blogue.
      Mas, na verdade, estes blogues, são para simples divulgação e troca de conhecimentos e não para efeitos comerciais, como o OLX, o COISAS ou outros mais - peço desculpa, mas penso que será importante esclarecer esta situação.
      Por outro lado, a apresentação que fez para a sua peça, de modo a promovê-la, o que conseguiu perfeitamente, e dou-lhe os Parabéns por isso, mais não é que uma pura e simples transcrição (cópia) do que apresentei na mensagem citada, o que me deixa deveras lisonjeado.
      Mas, na verdade, quando se procede desta maneira e se copia, fica bem citar a fonte de onde se extraiu a informação, pois até dá mais credibilidade à sua informação.
      Não há qualquer problema da minha parte, nem me incomoda tal situação, mas por norma "fica bem" citar a fonte, peço desculpa, mas penso que será importante esclarecer esta situação.
      Por vezes há "bloguer's" que se incomodam, o que não é o meu caso.
      Concluindo, agradeço a divulgação que faz da minha mensagem sobre a Fábrica de Cerâmica da Madalena, que não estou interessado na aquisição das suas peças (e caso tivesse recorreria aos sites comerciais), que tenha sucesso imediato com a venda das mesmas e que continue a ser um visitante do meu blogue VELHARIASTRALHASETRAQUITANAS.
      Cumprimentos e Boas Festas.

      Jorge Gomes

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  3. Parabéns pelo trabalho !!
    Estava pesquisando sobre a Madalena, pois hoje comprei 36 peças, sao pratos fundos, rasos e sobremesa, decorados com o casal romantico. Incrivelmente paguei 20,00. As peças sao lindas. Decidi conhecer a estória e acabei por encontrar este blog! Gratidao pelas informações!
    Rosângela

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  4. Por mero acaso dei com este pequeno dado histórico sobre a "Cerâmica da Madalena", que eu já conheci, em 1975, como "Nova Cerâmica da Madalena", tendo como accionista principal a "J. Pimenta SA" (60%), José Ferreira Dias (30%), Engº Lemos (5%) e um outro sócio, cujo nome não me ocorre agora, com os restantes 5%. A sede era, de facto, em Queluz, na sede da J.Pimenta. Os sócios "minoritários", Engº Lemos e o Sr. ...(?) eram os dois técnicos que João Pimenta "levou" para a cerâmica, dando~lhes sociedade. O primeiro era o "homem dos azulejos" (reconhecido quer em Espanha quer em Itália) e o segundo era o "homem da loiça sanitária (também com curriculum no estrangeiro) e que veio a falecer, salvo erro em 1976. A "J.Pimenta" era a principal e única "cliente" da Cerâmica e, tendo sido esta "interrelacionada" a Cerâmica era "gerida" pela mesma "comissão" de Gestão. E estando a "J.Pimenta" praticamente "parada" a Cerâmica sofria as consequências desse facto. Em meados de 1975 ("verão quente de 75 !!!) a sede da Cerâmica foi transferida para Leiria e conseguiram passar a gerir-se com bastante autonomia. Em meados de 1977 a "Nova Cerâmica da Madalena" não só tinha aumentado a produção como tinha expandido a sua capacidade de produção. Teria, na altura, à volta de 400 trabalhadores. Cerca de 2 anos depois terá sido adquirida pela ROCA.

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