domingo, 21 de dezembro de 2014

TRAVESSA OITAVADA, MOTIVO “RAPARIGA”, FAIANÇA DE JOSÉ DOS REIS (?)

Nesta época natalícia em que as prendinhas fazem parte da nossa vivência, para presentear familiares e amigos, somos também levados por tal atitude a presentear os seguidores do nosso blogue também com umas prendinhas.

Hoje apresentamos a primeira e oportunamente outra mais.


A de hoje corresponde a uma rara travessa oitavada, com o motivo “Rapariga”, como em Portugal foi generalizado, pois mais não é que o motivo inglês “Minerva”, com uma interpretação livre e popular, através de decoração monocromática, a vinoso (cinzento azulado – cor de amora) e ao que presumimos ser uma Faiança de Alcobaça, fabrico de José dos Reis (dos Santos).


Por conseguinte uma peça fabricada, provavelmente, entre 1875 e 1897, e que pelo seu motivo e decoração, se pode considerar, como rara.


É uma faiança monocromática a vinoso (cinzento azulado – cor de amora), com 33,3 x 25,5 x 3,8 cm, moldada, em forma oitavada, a partir de um rectângulo, com covo acentuado e aba ligeiramente côncava, decorada com motivos vegetalistas, em série repetitiva, pintados a estampilha, com recurso a “chapa”, notando-se os “pontos” com falta de vidrado ou danificado pelas trempes quando foi ao forno.


A reserva central é soberba e pouco vulgar, pois possui uma paisagem, com duas deusas gregas, cujo motivo corresponde ao conhecido “Rapariga” da Fábrica de Louça de Sacavém, mas mais não é que o motivo inglês “Minerva”, (Deusa da Sabedoria e das Artes), intensamente produzido em várias fábricas de Inglaterra, em meados do século XIX, mas com maior incidência pela Podmore Walker & Co., e pela Wedgwood.





















A Fábrica de Louça de Sacavém começou a produzir faianças com esta estampa “Rapariga” ou “Minerva” a partir de 1870 e com maior intensidade no período de 1886 a 1894 (período da Real Fábrica de Sacavém), quando os seus proprietários eram ingleses, os Howorth.














O motivo desta travessa é efectuado, parte à estampilha, possui bastantes esponjados e várias pinturas e retoques à mão livre, para acentuar a decoração e vincar o sentido de profundidade da paisagem, nas árvores, nas balaustradas e nas escadas.  

O relevo no horizonte e as nuvens tem um contorno mais escuro e o seu interior foi cheio a pincel – pintura manual, cremos.


Trata-se de uma travessa não marcada, com uma massa de textura fina, de esmaltado leitoso, mais ou menos homogéneo, mas com falhas pontuais do mesmo, semelhante ao que à época se fazia em Coimbra, sob o qual se denota uma massa cor de grão (acastanhada).


Mas pela análise da decoração, do tipo de pintura realizada e da comparação efectuada com outras peças, atribuídas a José dos Reis, apresentadas, nomeadamente no livro “ Cem anos de Louça em Alcobaça”, de Jorge Pereira de Sampaio e Luís Peres Pereira (2008), leva-nos a considerar ser uma peça de José dos Reis.


Mas também poderia (ou poderá) ser Coimbra, como já nos disseram, mas cremos, pela decoração, pelos esponjados (que começaram a ser produzidos do segundo lustre do século XIX, cremos), que será, mais provável, Alcobaça (José dos Reis), do que Coimbra. Mas, certezas absolutas, não há!


Possui uma falha antiga na bordadura da aba e encontra-se gateada, transversalmente, com sete “gatos” recentes, sendo perfeitamente visível o consequente “cabelo” que a atravessa de um lado ao outro.

Mas, apesar de tudo isto não deixa de ser uma bela peça, pelo menos para nós…..


Em suma, a raridade da peça, constitui uma “prendinha” para os seguidores deste blogue.


FONTES:


1) – “ Cem anos de Louça em Alcobaça”, de Jorge Pereira de Sampaio e Luís Peres Pereira, 2008;

2) – “Faiança de Alcobaça, de 1875 a 1950”, de Jorge Pereira de Sampaio, Estar Editora, Colecção Fundamental, 1997 (?);

3) - “Cerâmica em Alcobaça – 1875 até ao presente: CeRamiCa PLUS” – Galeria de Exposições Temporárias – Mosteiro de Alcobaça; 6 de Abril a 4 de Maio 2011; Município de Alcobaça, 2011.

4) – “Faiança Portuguesa Séculos XVIII-XIX”, Colecção Pereira de Sampaio, Editores ACD, 2008.

5) – “Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, Organização, Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da Rocha Pinto, Editorial Presença, 3ª Edição, Lisboa, 1987.


6) – “Faiança Portuguesa – Séculos XVIII-XIX”, de Arthur de Sandão, Livraria Civilização, 2º Volume, Barcelos, 1985.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

PRATO EM FAIANÇA, MOTIVO “ESTÁTUA”. VERSÃO POPULAR – FABRICO DESCONHECIDO .

Prato de sopa em faiança, de fabrico desconhecido, monocromático, azul, com decoração central no fundo com o motivo “Estátua”, vulgarmente conhecido por “Cavalinho”, com a aba aerografada em azul, em degradação da bordadura a para o seu interior e com um filete cinzento a separar a aba do covo.


A decoração central do fundo do prato é estampilhada, com recurso a “chapa” ou a “stencil” recortado: coluna, cavalo, cavaleiro, torre (castelo), ramos da árvore e o ornato sob o cavalo e cavaleiro. A folhagem da árvore e o enquadramento do solo são esponjados.  



Trata-se uma versão popular do motivo “Estátua”, com recurso a três métodos diferentes de pintura: estampagem, esponjado e aerografado.



Interessante a “cópia imitativa” do motivo original, do cavaleiro com o braço direito levantado, semelhante à estampa mais vulgar da Fábrica de Louça de Sacavém, a fábrica mais identificada com este motivo.



O motivo “Estátua”, para além de fabricado na Fábrica de Louça de Sacavém também foi fabricado em muitas outras fábricas, sendo perfeitamente conhecidas e identificadas, pelos carimbos ou marcas: Fábrica de louça de Alcântara, em Lisboa; Fábrica de Massarelos, Fábrica das Devessas, Fábrica da Corticeira do Porto, no Porto/Gaia; Fábrica de José dos Reis (dos Santos), em Alcobaça; Fábrica das Faianças de S. Roque ; Fábrica das Faianças Capôa , Fábrica da Fonte Nova, em Aveiro e ….. muitas mais, não identificadas.



Não possui qualquer carimbo que possa identificar, origem, fabrico ou época de produção; admitimos que seja fabrico dito de Aveiro.




Presumimos tratar-se de peça do período de fabrico das décadas de 40 a 50, ou mesmo do início da de 60.

domingo, 7 de dezembro de 2014

TRAVESSA EM FAIANÇA AZUL E BRANCA DO SÉCULO XIX. ORIGEM? FABRICO?

Hoje premeio a todos com uma curiosa travessa em faiança, azul e branca, muito provavelmente da segunda metade do século XIX, cujo fabrico desconhecemos, mas com uma interessante decoração.


Não arriscamos a indicar qualquer fabrico, pese embora nos inclinemos para fabrico do Norte, da zona do Porto ou de Gaia; trata-se de um tipo de faiança, que facilmente muitos designam como “Miragaia” – nós não nos atrevemos a tal.


É uma travessa grande, arredondada, ao gosto da época (do século XIX), com uma interessantíssima decoração, cremos entre os motivos “Cantão Popular” e “País” ou “País de Miragaia”, como na gíria das feiras de velharias se designam.


Uma coisa é certa, trata-se de uma variante a estes dois motivos ou uma composição de ambos, que nunca vimos algo semelhante.


Em que localidade, em que fábrica e em que época teria sido fabricada?

Realmente, sabemos tão pouco sobre faianças.

Não nos atrevemos, levianamente, a dizer que é de Miragaia ou de Santo António do Vale da Piedade, ou de… ou de…, pois não temos justificações para tal.


Tanto que gostávamos de desvendar o segredo da mesma e saber tudo sobre ela: origem, fabrico, época de produção,…


A decoração do covo é intensa e interessante, com cinco conjunto edificados, alguns ao gosto oriental, mas outros com arranjo arquitectónico mais ao tipo País, pese embora num deles (o inferior da direita) não falte a tradicional ponte.


Todos os conjuntos são enquadrados em vegetação soberba e variada, sendo a afirmação central uma enorme árvore, pendida para a direita- os habituais conjunto de traços horizontais a darem o sentido de espaço e profundidade de enquadramento não faltam, tal como os que dão o sentido do céu e nuvens.


A limitar esta decoração do covo há um conjunto de dois filetes azuis, sensivelmente de igual espessura.


No limite da aba há um largo filete azul e na transição da aba apara o covo, igualmente dois filetes azuis, um mais largo que outro.


A decoração da aba é interessantíssima e pouco vulgar, constituída por uma alternância de reservas, com representações que não conseguimos caracterizar e que se assemelham a aletas, e de alveolados, com losangos, constituindo o motivo da aba.


Como se pode ver, trata-se de um peça totalmente partida, mal restaurada, com 29 “gatos” (agrafos) no tardoz, para ajudar a consolidar o mau restauro; mas tem uma longa história, de mais de um século, em que ia tendo um final infeliz, mas que o “amor”, “carinho” e “dedicação” da filha da sua proprietária, entretanto já falecida, contribuiu para a “manter viva”, vindo agora parar à nossa mão.


Gostamos muito dela, pretendemos projectá-la para o futuro, para conhecimento de todos, pese embora nada saibamos da sua origem, do seu fabrico da sua época de produção….


Quão interessante e deslumbrante é o mundo das faianças…

Comentário a 25.03.2015:

Não podíamos ter terminado melhor a nossa postagem, pois volvidos cerca de três vezes, que através de uma interessante postagem de “artelivrosevelharias”, a Maria Andrade desvendou o motivo da nossa travessa.

A mesma apresenta uma decoração livre e ao gosto do seu executante, mas fiel, do motivo inglês “KIRKEE”, na qual todos os elementos simbólicos do motivo decorativo estão presentes: “aquela baía do motivo central, com as formas vegetalistas  à beira da água, o edifício oriental mas com uma cruz no topo, o chorão, a vedação”, como diz Maria A.

E ainda “neste caso até a cercadura procura reproduzir a barra, tipicamente chinesa, que delimita o covo do prato inglês, repetida em menor escala no recorte da respetiva aba, não faltando as reservas com os motivos florais nesta versão portuguesa.”

Em suma, mais uma peça de faiança azul e branca que tem como ponto de partida uma faiança inglesa, neste caso da fábrica de John Meir & Son, estabelecida em Tunstall, Staffordshire e cujo período de laboração decorreu entre 1812 e 1836.

Não resistimos a reproduzir algumas  imagens das peças apresentadas na postagem de Maria A, para  evidenciar a analogia das peças:

A peça "original" de John Meir & Son

A marca da peça apresentada

A travessa apresentada em http://artelivrosevelharias.blogspot.pt/
Fontes:

1) - http://artelivrosevelharias.blogspot.pt/;



PRATO ESTAMPILHADO COM UM CAMPINO, FABRICO SÃO ROQUE – AVEIRO

Prato raso moldado, de formato circular, de aba relevada, com decoração monocromática sobre o vidrado, com uma cercadura na cor amarelo-torrado, aplicada a aerógrafo, junto do bordo, com fundo branco, e sobre o mesmo um motivo central, regionalista, de um campino.


É a imagem característica do campino ribatejano, sobre o cavalo, com a vara em riste e o barrete na cabeça.


Trata-se de uma decoração estampilhada (aplicada a estampilha – stencil ou chapa) sobre o vidrado, igualmente monocromática, na cor amarelo-torrado.



O prato assemelha-se ao formato “Espiga”, da Fábrica de Louça de Sacavém, com relevos na aba, até ao covo, com espigas ao longo da bordadura da aba.

Tal modelo de pratos foi efectuado para a Exposição do Mundo Português, tinham uma enorme variedade de modelos, começando pelo n.º 1202 e continuando por muitos mais.

Mas o prato que apresentamos não é fabrico da Fábrica de Louça de Sacavém, pese embora a mesma também tivesse realizado muitas peças com o recurso à estampilhagem e ao aerógrafo.

É fabrico das Faianças S. Roque, em Aveiro, que foi criada em 1955 pelo ceramista João “Lavado” (João Marques de Oliveira) (1905-?), então sócio da Fábrica de Louças e Azulejos de S. Roque, vulgarmente conhecido por Fábrica de S. Roque, esta fundada nos finais da década dos 20, por Manuel da Silva e Justino Pereira Campos, localizada no canal de São Roque.


A fábrica, Faianças S. Roque, apresentou as suas últimas contas a 27 de Dezembro de 2001, tendo o seu encerramento e dissolução sido registado em Outubro de 2002 e publicado em Diário da República, no mês de Dezembro do mesmo ano.

Esta fábrica, Faianças S. Roque, dedicou-se exclusivamente à produção de louças decorativas e utilitárias, tendo produzido bastante louça decorada com escorridos. Existem várias peças marcadas que exibem combinações de cores: castanho, amarelo, verde e preto nesses escorridos.


Todas as peças estão marcadas com carimbo circular, dentro dele algo que se assemelha a um “8”, como alguns dizem, mas mais não é de que a cabaça alusiva a São Roque. Razão pela qual também existem alguns carimbos também com um bastão.




Expliquemos, iconograficamente, São Roque é geralmente representado com vestimenta de peregrino, com a vieira típica dos peregrinos de Santiago de Compostela, com um longo bordão do qual pende uma cabaça.


Em suma um prato interessante, como cópia de um modelo de outro fabrico (FLS), muito conhecido á época e muito ao gosto do povo, em especial do Alentejo e Ribatejo, e daí o aproveitamento da imagem estampilhada no prato, para cativar a seu aquisição e consequente uso.  



FONTES:






6) -Porta aberta às memórias” – 2ª edição, Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2009;

7) - “Porta aberta às memórias” – Museu de Cerâmica de Sacavém – Câmara Municipal de Loures – Setembro de 2008;


quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

DOIS INTERESSANTES PRATOS DA CORTICEIRA DO PORTO, DE 1931

As peças de faiança, mais simples, mais modestas, de uso utilitário corrente também são, por vezes, interessantes e contribuem para traçar a imagem evolutiva e a história de uma fábrica e dos seus períodos de fabrico.










Tudo isto a propósito de dois pratos, sopeiros, de uso doméstico correntes, com uma singela decoração de cinco filetes na aba: um no limite da bordadura da aba, na cor preta e outro semelhante na transição da aba para o covo; os restantes três no meio da aba, equidistantes entre si, sendo o central de cor azul celeste e os outros dois que o ladeiam igualmente pretos.










Peças em faiança leitosa, com várias imperfeições de fabrico, e com “os pontos” das trempes da cozedura perfeitamente evidentes, quer na frente dos pratos, quer no seu tardoz – aqui ainda mais notórios.


Mas afinal o que torna interessante estes pratos? A sua marca, pois são pratos marcados identificando o seu fabrico!










Possuem marcas circulares gravadas na pasta, com a indicação, na coroa exterior “CORTICEIRA” e “PORTO” e no círculo interior “1931”, sendo que uma das marcas, para além de gravada na pasta também possui sobre a mesma um carimbo na cor verde, ou foi efectuada uma pintura, sobre a marca para evidenciar a mesma.


Crê-se que esta fábrica – Corticeira do Porto - laborou desde os finais do século XIX até meados da década de sessenta do século XX, logo, os pratos que apresentamos corresponde já ao último período de laboração da fábrica, quando a produção de peças e a sua decoração eram mais simples, com menor beleza e algum descuido de qualidade.

Carimbo Inicial (Provável)
Carimbo 2ª fase de fabrico
Carimbo 2ª fase de fabrico (parte final)
Carimbo 3ª fase
Carimbo fase final (na Calçada das Carquejeiras)
Carimbo fase final (na Calçada das Carquejeiras)
Marcação manual, peças pintadas à mão

Marcação manual, peças pintadas à mão (fase final). Provavelmente.


As próprias marcas ou carimbos já não possuíam a exuberância de anteriores períodos, em que no círculo central existia o monograma “CP” e exteriormente à coroa, ladeando a mesma, dois ramos de louro – uma marca “laureada”; ou noutras fases de fabrico em que o carimbo era muito mais simples, mas muito característico da fábrica - só o monograma: um entrelaçado “C-P”, geralmente na cor verde.

Cremos pois, que este carimbo corresponde ao último período de fabrico da Fábrica da Corticeira do Porto.










É talvez de todas as fábricas existentes, da que menos se sabe, e apesar de toda a pesquisa já efectuada e de vários trabalhos publicados sobre as cerâmicas do Porto, pouco se descobriu.


Dá-se como certo que teria ficado a laborar em parte  das instalações pela fábrica do Carvalhinho, na Calçada e  Rua da Corticeira, em 1923, sob a orientação do industrial António Silva; e posteriormente por um funcionário daquele, António Pereira da Silva.

Quando começou a laborar desconhece-se. Presume-se que laborou até meados da década de sessenta do século passado.

Fontes: