Para começar o Ano de 2017 e após um
prolongado interregno de colocação de postagens no blogue, eis que apresentamos
um esplêndido prato em Faiança, que com uma interessante decoração, que o veio
a tornar prato de pendurar ou de decoração, através do orifício efectuado com
uma roca na aba, para tal.
(FIG. 1 - A nossa Peça - Fabrico de Coimbra ?) |
Presumimos que tenha sido fabricado no
final do século XIX, ou mais provavelmente na primeira metade do século XX, em…
aí o grande mistério, e que torna a peça ainda mais interessante por tal
incógnita, tal como a maioria das faianças não marcadas, que não se conseguem
descobrir ou indicar com rigor a sua data de fabrico e onde foi fabricada.
Vamos então à peça.
Um prato covo ou sopeiro, de diâmetro
mais pequeno que o habitual, mas perfeitamente identificado aos que faziam às
épocas já indicadas.
(FIG. 2 - O Filete de bordadura e a decoração da Aba) |
Vidrado na cor de grão, com um filete
largo, na bordadura da aba, em cor-de-rosa esbatido, possuindo sete decorações
monocromáticas, repetidas, efectuadas a chapa ou stencil, com as partes
terminais sobrepostas ou desalinhadas, conforme a perícia do decorador deste
prato.
No fundo do prato uma vistosa e elegante
decoração policromática, ao gosto oriental mas com elementos vegetalistas da
flora mediterrânica – o arranjo artístico ao gosto do decorador, certamente.
(FIG. 3 - A Beleza da decoração policromática do covo do prato) |
Um pagode, com um chapéu chinês, com
zimbório de remate, e sobre o mesmo várias aves sobrevoando, uma base de
enquadramento, onde assenta o pagode e da qual desenvolve a vegetação arbustiva
que encena a imagem, tornando a mesma harmoniosa, no formato e na cor.
A policromia usada: castanho-escuro,
vermelho escuro, azul-marinho e verde-ervilha dão a beleza e a animação à cena
apresentada, que preenche a quase totalidade do fundo do prato.
Na generalidade a técnica de decoração
utilizada foi a chapa recortada ou stencil, somente com alguns apontamentos a
pincel, nas folhas na cor verde-ervilha e nas flores na cor azul-marinho
enquadradas na base castanha.
(FIG. 4 - O tardoz do prato) |
No tardoz denotam-se algumas
imperfeições na massa, aquando da moldagem da pasta, algumas imperfeições,
faltas e arrepiados no vidrado, bem como as marcas das trempes que a peça
voltou ao forno para cozer o vidrado.
(FIG. 5 - O Orifício para pendurar o trato) |
Possui um único frete, na bordadura do
fundo. Nada mais.
(FIG.6 - As imperfeições do vidrado) |
Gostaríamos de completar esta postagem
com a indicação da possível época de fabrico e do centro ou fábrica da sua
execução, o que também não conseguimos.
1- ONDE E QUEM FABRICOU PEÇAS
SEMELHANTES?
O centro Oleiro de Coimbra, com as suas
diversas e anónimas fábricas, quer ao longo do século XIX, quer mesmo na
primeira metade do Século XX produziram imensas peças semelhantes à que
apresentamos, sem marcas e consequentemente não identificadas.
Mas as fábricas que surgiram no final do
século XIX e nas primeiras três décadas do século XX no centro Oleiro de
Alcobaça, também produziram peças muito semelhantes, pois que, afim e ao cabo,
as produções copiavam-se, ou mesmos eram os artistas e decoradores que até
mudavam de fábricas, para fábricas, o que ainda torna mais difícil indicar uma
origem de fabrico, com algum rigor.
As mínimas diferenças que possam haver,
ou as subtilezas que possam distinguir um fabrico de outro nem sempre são
identificadas, por leigos como nós.
Vamos tentar sistematizar algumas ideias
e identificar algumas particularidades dos vários fabricos.
2- FAIANÇA DE COIMBRA
A Faiança de Coimbra, para este tipo de
peças, de uso quotidiano e utilitário, recorria com muito frequência ao motivo
Casario, com predominância em policromia, com cores deslumbrantes.
Já usava o verde-ervilha ou o verde
inventado por Vandelli.
A textura da peça era geralmente fina,
leve e com uma pintura cuidada, sendo que a decoração tinha com frequência
inspiração em motivos orientais.
A pasta, pelo que se consegue
identificar era geralmente na cor de grão, ou alaranjada, em função da mistura
de barros que faziam e o vidrado era geralmente amarelado (cor de grão).
(FIG 7 - A decoração do fundo do prato) |
3- FAIANÇA DE ALCOBAÇA DE JOSÉ DOS REIS
DOS SANTOS (1875-1898)
O motivo da decoração era
predominantemente o Casario, o País e por vezes o Chalé, com pinturas
monocromáticas, em tons de azul, rosa ou manganés.
As técnicas de decoração eram o
estampilhado, o esponjado, mais o habitual pincel.
Quer em termos de decoração, pintura e
vidrado, havia cuidado e dedicação no fabrico.
4- FAIANÇA DE ALCOBAÇA DE MANUEL
FERREIRA DA BERNARDA JÚNIOR (1900-1930)
Fabrico percursor do anterior, tinha
muitas semelhanças com o mesmo, pese embora com outros motivos de decoração,
que não só o Casario, mas também como motivos zoomórficos.
A decoração era efectuada em policromia
e em que os artistas e decoradores repetiam os mesmos temas, sem grandes
variações e sem muita perfeição.
Tratava-se de uma louça com linhas
(formas) e composições estéticas (motivos de decoração e cores) mais para as
sociedades rurais.
5- FAIANÇA DE ALCOBAÇA DE RAUL DA
BERNARDA (1931-2008)
Raúl da Bernarda era filho de Manuel
Ferreira da Bernarda Júnior, e quando iniciou a sua actividade, independente do
pai, pelo menos na sua fase inicial de produção repetiu os motivos e as
decorações que eram realizadas na fábrica do pai, por vezes só identificadas,
quando passaram a ser marcadas ou assinadas.
6- FAIANÇA DE ALCOBAÇA DE OLARIA DE
ALCOBAÇA LDA. (OAL) (1927-1987)
Esta
fábrica de produção foi fundada por Silvino Ferreira da Bernarda, também filho
de Manuel Ferreira da Bernarda Júnior e por António Vieira Natividade e Joaquim
Vieira Natividade e que também no seu início de fabrico produziu louça igual às
anteriormente citadas.
Era uma produção de louça, na
continuidade, do que o seu pai produzia, com o recurso aos habituais processos
de estampilhagem, esponjado e a pincel, já com motivos vegetalistas
incorporados, em policromia, pelo que se assemelhavam, facilmente, à louça de
fabrico de Coimbra.
7- E ENTÃO?
Em suma, pode-se dizer, com alguma
segurança, que as formas e os motivos decorativos usados eram copiados das
peças que melhor se vendiam, por corresponderam aos gostos de quem as compravam
ou de quem as podiam comprar e vários fabricavam igual ou semelhante e daí a
impossibilidade de agora se indicar o seu provável fabrico e época de execução.
(FIG. 8 - O esplêndido prato, de Coimbra ? ou de Alcobaça?) |
FONTES:
1)
– “ Cem anos de Louça em Alcobaça”, de Jorge Pereira de Sampaio e Luís Peres
Pereira, 2008;
2)
– “Faiança de Alcobaça, de 1875 a 1950” – S. l. Jorge M. Rodrigues Ferreira, de
Jorge Pereira de Sampaio, Estar Editora, Coleção Fundamental, 1997 ;
3)
- “Cerâmica em Alcobaça – 1875 até ao presente: CeRamiCa PLUS” – Galeria de
Exposições Temporárias – Mosteiro de Alcobaça; 6 de Abril a 4 de Maio 2011;
Município de Alcobaça, 2011.
4)
– “Faiança Portuguesa Séculos XVIII-XIX”, Colecção Pereira de Sampaio, Editores
ACD, 2008.
5)
– “Cerâmica Portuguesa e Outros Estudos”, de José Queirós, Organização,
Apresentação, Notas e Adenda Iconográfica de José Manuel Garcia e Orlando da
Rocha Pinto, Editorial Presença, 3ª Edição, Lisboa, 1987.
6)
– “Faiança Portuguesa – Seculos XVIII-XIX”, de Arthur de Sandão, Livraria
Civilização, 2º Volume, Barcelos, 1985.
7)
– “A Loiça de Alcobaça”, de João da Bernarda, Edições ASA, 1ª Edição, Porto -
Outubro de 2001.
8)
– “A Faiança de Raul da Bernarda & F.os, Lda. – Fundada em 1875 –
ALCOBAÇA”, de Jorge Pereira de Sampaio, Edição Particular da Fábrica Raul da
Bernarda & F.os, Lda., Alcobaça, Outubro, 2000.